ATENÇÃO

Tenho como obrigação dizer que todos os personagens e a maioria dos lugares citados são ficticios e qualquer semelhança com parentes, amigos ou conhecidos vivos ou mortos é mera coincidencia.

Devo avisar também que os textos podem conter descrição de sexo e/ou violência não recomendados para menores de 16 anos.

Você não é obrigado a ler isso!

sábado, 23 de agosto de 2008

Anjos Também Pecam


Era noite de lua cheia, acabara de anoitecer, 19h45min, a lua iluminava pouco as ruas de Londres pelo fato de ter nuvens ao céu noturno cobrindo parte do próprio inclusive a lua, as ruas estavam molhadas e úmidas pela chuva que passara à cerca de uma hora. O vento, frio e cortante como a lâmina de uma navalha, levava as nuvens ao longo do céu. Acima da cabeça das pessoas, alto, no telhado de uma capela, estava uma mulher de estatura média com idade próxima aos 27 anos, boca e cabelos vermelhos como sangue derramado, olhos de um límpido verde como água, seu rosto, claro e definido delicadamente, eram enfeitados por algumas sardas. Vestia roupas apertadas de couro negro, um sobretudo justo protegendo-a da chuva que passara. Estava nas ruas a algum tempo.

As ruas já estavam vazias, ao menos por ali. Quase ninguém se arriscava a sair à noite pelos assassinatos estranhos que estavam acontecendo pelas redondezas. Assim ninguém percebeu quando ela se atirou de 70 metros de altura e aterrissou sem receber danos e saindo andando. Estava observando, indagando, analisando as ruas a procura de algo... ou alguém.

Após cerca de 20 minutos de caminhada às ruas úmidas e molhadas, virou a direita em uma porta clareada por uma lâmpada e abaixo dela podia-se ler as palavras:

BAR DO JOEY

Olhou para cima lendo novamente a placa que já conhecia e abrindo a porta que segurava pela mão esquerda encostando-a na parede de dentro forçando-a a fixar-se nela e em seguida entrando no estabelecimento. O bar era pequeno e possuía apenas uma meia dúzia de mesas e algumas poucas cadeiras fixas frente ao balcão. Não havia ninguém, sentou-se a uma das cadeiras fixas e olhou ao seu redor, quando a porta do lado esquerdo do outro lado do balcão abriu. Veio saindo da porta um homem alto, cabelos longos e negros como noite, de pele morena clara, olhos castanho claro como o mel, roupas escuras. Assustou-se ao vê-la sentada ali.

- Uou, já chegou Anny!? Como de costume não?

- Está atrasado. Disse ela em meio a um curto e discreto sorriso, sua voz era melodiosa.

Joey terminou de guardar as garrafas de cerveja e olhou para o relógio ao pulso.

- Ah! Balançou a cabeça. 7 minutos não é atraso! Sorriu ele.

- É sim desde que está marcado para abrir às oito. Disse-lhe abaixando a cabeça e levantando-a em seguida.

Fez-se um instante de silêncio até que Joey Perguntou.

- Como estão indo as investigações? Será que desta vez você consegue?

- Em relação à primeira pergunta, não tenho certeza, mas consegui ver certo padrão nos assassinatos e creio que esta noite ele ataque novamente. E em relação à segunda, espero que sim, já faz muito tempo que estou aqui.

Anny a muito havia sido expulsa do Éden¹ e tido suas asas arrancadas pela execução de um dos maiores pecados, matar um mortal, esse ato havia sido, de certo modo, acidentalmente. A alma do mortal havia sido corrompida por um Demônio e estava colocando a vida de outros mortais em perigo, havia um jeito de retorná-lo ao lado do bem, mas era difícil e ela não conseguiria a tempo. Ela estava lutando com o Demônio enquanto o mortal colocava a vida de outros mortais em risco, logo, Anny apenas destruiu o Demônio não obliterando-o² e tendo que matar o mortal. Isso foi visto como um pecado e, em seu julgamento, foi-lhe dada a pena de expulsão do Éden tornando-se assim um Anjo Caído. Ela estava na terra como tal fazia 30 anos e conhecera Joey a apenas 15.

Joey era um bom amigo e ajudava-a nas investigações, era um mortal, mas conhecia como ninguém os outros mundos e disponibilizava da utilização de magia.

Anny esfregou a mão no rosto e falou:

- Ande logo e me dê um copo daquele whisky.

Ele pegou um copo sob o balcão e despejou o conteúdo de uma garrafa antiga que ele tinha – e Anny estava acabando com ela. Anny estava engolindo todo o conteúdo do copo de uma só vez quando entraram três rapazes jovens e vestidos normalmente. Anny terminou o copo enquanto Joey atendia os jovens sem olhá-los, quando subitamente sentiu algo, uma pressão sobre seu peito a engasgou, sentia-se estranha, não havia sentido isso antes, mas sabia que algo estava acontecendo. Anny levantou-se e saiu subitamente e sumiu aos olhos de Joey.

Seguia pelo seu instinto, não sabia onde estava indo, mas sabia que daquela noite não passaria, não podia deixar que os assassinatos continuassem. O assassino deixara sempre apenas algum símbolo egípcio gravado ao chão com escritas de mesma origem circundando o próprio. As escritas eram feitas por uma espécie de carvão que Anny conhecia, e o cheiro no local dos assassinatos era de enxofre.

- Cheguei! Pensou ela parando frente a uma escola e sacando de seu impermeável um pequeno punhal de aparência persa com uma jóia vermelha incrustada na base superior da empunhadura, próximo à lâmina. Já havia andado cerca de um quarto de hora.

Anny logo percebera que a escola estava abandonada. Foi andando calma e silenciosamente pelos corredores vasculhando sala por sala até que ouviu alguns gemidos vindos de debaixo, seguia por uma escada de madeira velha cujo andar produzia rangidos. Desceu lentamente os degraus e foi avistando a medida que descia algo parecido com um depósito, mas não havia mais nada ali, apenas um espaço vazio e amplo. Ouviu novamente os gemidos, mais alto, seguiu um pouco mais para ter a visão total do depósito. Avistou uma mulher de cabelos lisos e negros, pele clara e olhos escuros, estava nua, acorrentada e amordaçada. Anny prestou cutela, sabia que o Demônio estava por ali e não podia vacilar. A mulher apenas gemia, estava inconsciente, Anny até agradeceu por isso. Por de trás da tábua onde continha a mulher aprisionada havia um corredor úmido.

Anny atravessara o corredor calma e lentamente pondo um passo à frente do outro cautelosamente. Ao termino do caminho encontrou uma sala vazia que continha apenas uma mesa de madeira de aparência antiga iluminada por velas. Antes do termino do passo seguinte alertou-se a sua esquerda e saltou à frente esquivando-se do golpe desferido, ao cair e rolar para frente circundando seu próprio corpo para dar de frente ao seu inimigo, chamas azuladas surgiram e moldaram-se em círculos ao seu redor.

As chamas se elevavam até o teto e o Demônio conhecia muito bem o que era aquilo e deu um passo à trás, era conhecida por eles como Chama Purificadora, a pior arma que um Demônio poderia enfrentar. Enquanto Norpheles se afastava das chamas celestiais Anny olhava-o fixamente, seus olhos flamejavam juntamente com o que lhe circundava, então surgiu em uma de suas mãos a figura de uma espada feita pelo mesmo material do fogo. Em questão de milissegundos o fogo se dissipou como que por vontade dela e Anny pôs a saltar de lá de dentro empunhando a espada flamejante em uma das mãos e sua adaga na outra. Norpheles não teve reação alguma ao ve-la saltar em sua direção, tentou por último pôr suas duas espadas frente ao enorme perigo que agora lhe ameaçava, mas em vão, a lâmina flamejante atravessou-lhe as espadas como se não existisse e acertou-lhe o ombro queimando-o intensamente. Norpheles gritou de dor, uma dor que nunca antes havia sentido, a dor de seus pecados caindo sobre si próprio.

Gritou e sucumbiu ao chão frente à intensa dor que aquele fogo lhe conferia. Anny pôs a frente dele levantando a espada com a ponta da lâmina virada para baixo, sobre o corpo do Demônio. Após um único segundo de prece Anny largou a espada e à medida que ela ia entrando pelas costas desaparecia por completo na criatura em forma de humano. O Demônio estremeceu-se e ergueu sua cabeça com um grito de dor e sua mão elevada ao peito, Anny a esse momento já havia retirado de seu impermeável uma espécie de receptáculo com runas incrustados em sua base de ouro. Anny olhou fixamente em seus olhos dizendo palavras indecifráveis na língua humana, no fundo de seus olhos podia-se ver uma chama queimar demonstrando o que acontecia com sua alma nesse momento. Ao termino do encantamento o corpo de Norpheles tornou-se pó e sua alma fora sugada para dentro do receptáculo.

Naquela mesma noite, mais tarde, quem olhasse para cima da capela de São Pedro poderia ver uma figura a observar a cidade. Anny sabia que, mesmo após 200 espíritos demoníacos terem sido presos por ela e cerca de 300 almas humanas salvas, talvez ela nunca voltasse ao Éden.

- Bruno Gaviorno


NOTAS:

1 – Éden é o que os humanos chamam de céu, é para onde as almas boas vão quando morrem e a moradia originária de todos os Celestiais.
2 – O ato de Obliteração é o ato de destruir, aprisionar ou devorar a alma de um demônio ou um anjo.